quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Análise da relação entre sociedade brasileira e constituição


       As constituições têm, contemporaneamente falando, recebido uma carga maior de atribuições e importância em um ordenamento jurídico. Em torno dela gravitam todos os demais sistemas jurídicos e a mesma reflete o espírito de uma nação em seu tempo.
A relação da sociedade brasileira com a Constituição é uma relação historicamente complicada, visto que seu texto já sofreu diversas modificações ao longo do tempo, desde a primeira carta constitucional até o estabelecimento da atual, jovem, porém já construída sob paradigmas antigos ou questionáveis, dando margem à necessidade de uma enorme quantidades de emendas e um judiciário cada vez mais militante e ideologicamente comprometido com valores que estão aquém de seus princípios fundantes.
Mas, para que esta investigação alcance seus objetivos, urge saber quais são os fatores sociais que fazem com que o Brasil tenha em sua constituição uma série de atribuições que em outras constituições não há sequer menção, ou entender as razões da quantidade de medidas para alteração da constituição, ou até mesmo compreender os porquês das constantes ações diretas de inconstitucionalidade.
Um primeiro ponto para análise é a questão relativa à “anemia democrática”, ligada ao poder legislativo e fraqueza das instituições político-partidárias, sendo que as mesmas não representam a vontade popular efetivamente. Sendo assim, abre-se um vácuo para a militância e a criação de ícones que tentarão ocupar esses espaços.
No atual momento, há uma grande interferência da suprema corte sobre grande parte das decisões, interferência esta que somente acentua os problemas legislativos e superlativa as cortes supremas do país, trazendo morosidade aos processos que de fato deveriam ser discutidos pela casa e a sensação leiga de que apenas o judiciário é plenamente capaz de resolver os problemas do país.
Mas os problemas supra citados possuem uma origem bem mais profunda e nos remete à primeira constituição feita no Brasil, a constituição dos tempos do império.
A primeira constituição brasileira é de 1824, onde sequer tínhamos uma nação independente do império. A mesma era opressora e de democrática nada tinha. Somente em 1988 o Brasil experimentou uma constituição que garante a democracia e enfatiza os direitos individuais, porém é inegável que todas elas carregam consigo a dissociação do Brasil real, ou seja, não representam efetivamente o povo e suas aspirações.
A constituição de 1988 é a mais extensa de todas, possuindo em sua votação final, 250 artigos e 70 disposições transitórias, totalizando 320 artigos, porém mesmo assim, sua essência já nasceu velha, até outubro de 2011 a constituição federal já havia recebido 67 emendas, uma média de 3 emendas por ano.
Alguns estudiosos são altamente críticos da amplitude buscada pela constituição, segundo o historiador e cientista social Marco Antônio Villa, “É difícil encontrar algo da vida social que a constituição não tenha tentado normatizar. Acabou se transformando em programa-econômico-político-social para o país”.
Segundo o mesmo autor, fatores como a queda do muro de Berlim, a política social-democrata na Europa e a crise da divida externa iniciada no México em 1982, influenciaram diretamente na confecção da Constituição, sendo a mesma “refém” deste contexto histórico.
Ao nosso ver, esta visão sobre a Constituição Federal é um tanto quanto redutora e minimalista, visto que, o direito sempre será influenciado pelo ambiente social e sua compreensão sempre deverá ser feita sob o prisma do contexto histórico, uma vez que é impossível a dissociação do mesmo.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 passa longe de ser a melhor constituição do mundo, porém deve-se a ela diversos progressos no que tange aos direitos individuais e políticos, uma possibilidade jurídica de mudanças progressistas no panorama sócio-econômico, uma maior possibilidade de intervenção do Estado em favor dos menos favorecidos e uma proteção institucional contra novas forças ditatoriais.
Porém, deposita nas mãos de um poder não eleito pelo povo um enorme poder de alterar a interpretação do direito ao seu bel prazer. Logo, há de se recuperar o fulgor democrático, para que com isto, o país possa novamente eleger quadros legislativos que, eficazmente, realizem o seu papel social e retirem das supremas cortes o expediente quase legislativo dos quais os mesmos têm gozado.
Ademais, somente com uma melhor relação do povo com sua democracia, ou seja, com maior participação popular nas causas políticas, será possível conter a onda de magistraturas militantes das quais o Brasil sofre desde os tempos do império.
Concluímos com esta reflexão, que a sociedade brasileira padece de compreender melhor a constituição que possui e, com isto, melhorá-la com vistas ao atendimento de suas próprias demandas e deposita em outro poder, no caso o judiciário, suas expectativas para que a mesma seja cumprida, ainda que a sociedade como um todo a desconheça por completo. Além disso, a pedagogia que levaria a sociedade a compreender o funcionamento constitucional não é feito nem pelo judiciário, nem pelo legislativo, nem pelas mídias e nem pelo ensino básico, o que forma uma sociedade totalmente alienada sobre o funcionamento das leis que regem a sua própria existência como cidadão.


Bibliografia:

- Villa, Marco Antônio – A história das constituições brasileiras
- Demais conteúdos são de perguntas efetuadas nas aulas de Teoria Geral do Direito, ministradas pelo ilustre Professor Bernardo Nogueira

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