segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Personagem desse tempo

     Ele tem um olhar um pouco triste, passa a todos um ar meio blasé, afinal, para os pseudocults é fundamental ter um ar deprimido, a vida não é boa para ninguém e o mundo é cruel demais para se viver sorrindo. Para ele Deus não existe, a vida não tem sentido algum e a morte é a única certeza inevitável. Com este patético acervo intelectual ele conduz sua vida e essas conclusões que para muitos são óbvias, para outros um escândalo, são a razão do nosso personagem se julgar alguém mais inteligente e especial que o restante da humanidade.
     Antes de prosseguir com a história, gostaria de dizer que existem tipos desses aos borbotões, geralmente se auto intitulam muito bem e possuem uma enorme facilidade em dizer que são algo que sequer parecem ser. Costumam se autodenominar como poetas, sem ter uma obra a apresentar, ou então filósofos, sem nunca terem produzido um trabalho intelectual de algum dos milhões de assuntos atinentes ao amor à sabedoria.
       Só faltava dizer que nosso personagem não trabalhava, sua vida é cheia de "trabalhos criativos" e que estes trabalhos lhe tomam seu tempo de forma excessiva e que prefere passar por sérias necessidades financeira a se submeter ao modo opressor que se ganha a vida no regime capitalista.
        Nosso personagem, caro leitor, povoa as redes sociais com seus tratados e suas críticas contumazes a tudo o quanto há e existe, afinal, o mundo é opressor demais. Nosso personagem pensa que a arte é um refúgio e uma manifestação de sua genialidade.
        Tenho um amigo, que por sinal detesta o nosso personagem, que diz que falta proletarismo na vida de muita gente. Sim o termo é esse, meu amigo inventa palavras vez por outra.
         Voltemos ao nosso personagem, não lhe darei nome, se chamará Personagem.
          Certa feita encontramo-nos para conversar algo sem importância, então Personagem começou com seu discursinho. Suas conclusões não possuem premissas, quase todas as suas críticas se baseiam em argumentos ad hominem e seu cabedal intelectual era limitado como exposto acima, mas como a diferença entre a genialidade e a estupidez é que a primeira tem limite, não cessava de falar:
            - Temos que continuar com o atual governo, melhor que a volta dos coxinhas...
            Fico em silêncio.
            - Estou com um novo projeto, tem tudo para dar certo...
            Aceno positivamente com minha cabeça, simulando aprovar seu projeto.
            - Sabe, sou contra religião, acho que as pessoas que tem fé são doentes...
            Começo a me incomodar. Não que eu seja um homem de fé, mas prefiro um crente a um ateu de boutique.
             - Esses caras do stand up fazem piada de tudo, eles são todos uns sem talento ...
             Lembro-me de quanto gosto de comédia e de quanto tempo estou perdendo com aquela conversa, peço licença e me despeço dando uma desculpa qualquer.
             Chego em casa e faço um inventário de minha alma, me comparo ao Personagem e tento ver se ele é algum alter ego meu, graças a Deus, descubro que já passei desta fase. Vasculho os meus contatos para ver se tem mais alguém semelhante ao Personagem em minha lista de amigos e contatos, ufa! Ele é um dos poucos que ainda mantinha contato.
               Mantinha, porque ele não merece uma crônica sobre ele, não merece minha preocupação, tão pouco que eu me ocupe com ele, não merece que lhe ceda meu ouvido e gaste meu tempo, não merece sequer fazer parte de minhas redes sociais.
                Personagem é um personagem de nosso tempo estranho, o tempo do conhecimento fast food e da cultura adquirida na velocidade de um macarrão instantâneo, Personagem é um triste produto da sociedade do espetáculo e da revolução dos idiotas, tornando a vida algo vil, como um palco para suas idiotices.
         

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