terça-feira, 23 de julho de 2013

O ingresso

Antônio se apressava, precisava andar, correr, ser o mais rápido possível, estavam acabando os ingressos para o espetáculo que ele tanto esperava. Era a ultima apresentação daquela companhia em sua cidade. Foram dez apresentanções de Hamlet, era a última naquela cidade, Antonio teve várias chances mas ele nunca foi organizado, assim como todo brasileiro (quase todos) deixou tudo para a última hora.
Em sua casa brigou com o irmão pois precisava de tomar seu banho, brigou com sua mãe, por não ter agilizado o jantar, brigou com seu pai … , por alguma razão qualquer que nem Antônio se lembrava. Só sabia que se perdesse o espetáculo alguém seria responsabilizado.
Antônio nunca foi muito bom em assumir os próprios erros, isso parecia intranhado em sua personalidade. Certa feita, quando era ainda criança foi reprovado em Língua Portuguesa e ele teve o disparate de por a culpa na colonização portuguesa. Dizia ele “se fossem os ingleses as coisas seriam diferentes”, é claro que ninguém o levou a sério e as palmadas o esperavam em casa.
O horário da peça estava próximo, o ônibus de Antônio estava lotado, o aperto foi tanto que desceu em seu ponto totalmente amarrotado, parecia que sua camisa desconhecera o que era um ferro de passar.
Mesmo assim foi correndo em direção ao teatro, bufava, não era acostumado a exercícios físicos. O teatro crescia na direção de Antônio, sua alma era invadida por uma ansiedade antes inexplicada.
Na bilheteria, fitou aos olhos da moça que vendia os ingressos e sem nenhuma palavra, gesto ou som recebeu da moça da bilheteria uma belo sorriso.
- Moço, como o senhor é sortudo, é o último ingresso!
- Quanto é? Respondeu Antônio em uma grosseria e frieza digna dos mais insuportáveis homens, sendo capaz de silenciar o sorriso da moça da bilheteria.
- 30 reais. Respondeu a moça descepcionada com a grosseria de Antônio.
- Não eram 15? Retrucou Antônio
- Somente para quem possui carteirinha de estudante. Retrucou a moça louca para que Antônio desistisse de ver a peça.
- Isso é um roubo! E Antônio paga o ingresso indignado por ter deixado sua carteirinha em casa, mas como é de seu feitio reclamar de tudo e todos foi ao final da fila e esperou.
Esperar, eis um ato que o ser humano não constuma ser muito eficaz. Antônio era pós-graduado em reclamar de filas de espera. Também pudera, para tudo ele enfreta filas, para pegar o ônibus e o metrô, para almoçar no PF próximo ao trabalho, na fila da fotocopiadora para copiar os papéis em seu trabalho, para pagar as contas do escritório de contabilidade em que trabalha. Sua vida é uma fila.
Antônio, aproveitava suas filas para ouvir música, era apaixonado com bandas de rock alternativo e progressivo. Ouvir Led Zepelin é para ele um hábito quase que religioso. Só que naquela fila estava sem nada para ouvir senão a buzina dos carrros e o murmúrio de pessoas iguais a ele que são tão impacientes quanto ele ou então piores. Essas pessoas constumam ser profundamente irritantes, certamente a grande maioria só estava ali por causa do galã de TV que faria o Hamlet.
A fila não andava, Antônio estava desesperado, se indignava, cerrava os pulsos, suava frio, roía as unhas, lia repetidas vezes o que estava escrito no ingresso, no cartaz e nas placas próximas. Seu pensamento divagava em direção ao nada até que seu pensamento é interrompido.
Um homem distinto se achega, trajava um terno preto simples com uma camisa branca e um sorriso largo no rosto, sua alegria era tão contagiante que ele seria capaz de fazer rir os mais desgraçados  na vida.
- Boa tarde! - Comprimenta Antônio e calmamente se achega atrás dele na fila
- Boa tarde! - Antônio responde com sua aspereza peculiar
- Que bom que chegamos a tempo – diz o homem ignorando a aspereza de Antônio – queria muito assistir essa peça, comprei os ingressos antecipados, mas me atrasei no caminho … , que bom que cheguei a tempo ainda!
- Que fila que não anda – Reclama Antônio.
- Filho, quanta impaciência, a vida é como uma fila! Basta ter o ingresso certo e chegar no horário o restante é consequência!
- Por favor meu senhor, nem lhe conheço e o senhor já vem filosofar para cima de mim!?

Antônio houvera sido extremamente rude, afinal o que aquele jovem senhor tinha a ver com seus problemas, porém duro como é, não se desculpou com o senhor.

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