Existem inúmeras dificuldades conceituais para a
compreensão do direito civil, pois, há diversas controvérsias em torno de uma
unidade em termos de conceito e uma ausência de uma clara definição de suas
funções. Logo, graças a essa ineficiência conceitual surge a necessidade de se
compreender e focalizar a moderna “fisionomia do direito civil”.
A
partir do Code napoleônico, o direito
civil é visto como um regulador das relações entre entes privados, com especial
ênfase à proteção da propriedade privada, sendo este código um protetor da
liberdade econômica ante ao estado, conforme um de seus enunciados, “direito de
gozar e dispor dos bens na maneira mais absoluta”. Neste contexto há uma
distinção muito clara entre direito público e privado, sendo o primeiro um
direito advindo do Estado com propósito de regular interesses gerais, já o
direito privado é compreendido no conjunto dos direitos inatos e inerentes aos
indivíduos.
Contemporaneamente
falando, com a crescente intervenção do Estado sob a esfera da economia (fato
impensável sob o olhar liberal) e até mesmo sobre a vida dos indivíduos, o
direito civil perdeu algumas de suas dimensões e acaba por ser compreendido
como uma série de regras que tem como alvo a “disciplina de algumas atividades
da vida social e satisfação de interesses de alguns indivíduos e grupos
organizados”. Porém, essas mudanças transcendem à “publicização” do direito
civil, mas se mostram como uma mudança de paradigma oriunda do Estado e pode
ser visto como um elemento de interação com as novas funções adquiridas pelo
Estado e pelas transformações relativas à esfera econômica.
Logo,
partindo das ideias positivistas e aprimoradas sob o paradigma
neoconstitucionalista, tem-se um direito civil submisso à esfera pública da
constituição, havendo a ruptura com a dicotomia direito público x direito
privado.
Sendo
assim, há de se encontrar na órbita da constituição, uma série de microcosmos
jurídicos acessórios à esfera do direito civil, tais como o Estatuto do Idoso e
o ECA. Esses microcosmos jurídicos são instituídos constitucionalmente e passam
a gravitar em uma zona limítrofe entre esferas jurídicas maiores, tais como a
esfera do direito civil.
Uma
vez que a própria constituição, a qual se submete todo o ordenamento jurídico
de modo a garantir-lhe unidade e coesão, delimita as esferas de ação e
influência do direito civil e cria novos microcosmos que o auxiliem na defesa
de interesses privados, tem-se um direito civil diminuído de suas atribuições
anteriores e entendido como um sistema jurídico a gravitar em torno da
constituição e a ela ser submisso.
Logo,
todos os entes jurídicos que são defendidos pelo direito civil acabam por
possuírem, dentro da esfera constitucional, sua validação estendida para além
da frieza da norma escrita e estritamente em seus limites, mas poder-se-á
compreender que tais entes estarão sujeitos a um controle de
constitucionalidade a validar todas as normas do direito civil.
Com
isto, tem-se um direito civil mais ligado aos valores constitucionais de um
povo e, em menor proporção, ligado aos interesses de quem detêm poderes e
propriedades e abrindo espaço de coletivização dos entes protegidos pelo
direito civil, criando para todos os entes uma função social.
Claro
está que a função social da propriedade e as responsabilidades individuais, que
outrora pertenciam a um conceito liberal e liberalizante do direito civil,
cabem hoje a maior de todas as esferas do direito, a esfera constitucional,
visto que a mesma contempla estas ideias em todos os sentidos.
Conclui-se
que os valores que justificam e fundamentam a constituição acabaram por
também fundamentarem a nova concepção
que tem-se sobre o código civil e suas consequências, visto inclusive sob o
prisma das decisões dos tribunais onde esta hermenêutica constitucional acrescenta
valor a toda leitura de preceitos do direito civil e seus entes de proteção.
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